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terça-feira

Cartum da Semana:

Cartum de autoria do Santiago.



sexta-feira

Farinha pouca

Weber Figueiredo

Para compreendermos melhor os conflitos no mundo onde vivemos é interessante partirmos de premissas básicas, simples, insofismáveis e que obedeçam as leis da física. Uma delas afirma: tudo que temos ou que consumimos vem dos recursos naturais do planeta Terra, os quais são finitos. Exemplo simples: um automóvel é a mistura de bauxita (alumínio), minério de ferro (chapas), areia (vidros) e petróleo (borrachas e plásticos). Para o homem produzir riquezas, desde tijolos, tecidos, computadores, até aviões e satélites, necessita de recursos naturais, somados à energia, trabalho e tecnologia, que é sinônimo de conhecimento.
Não há alternativa, todo crescimento econômico agride a natureza porque extrai os recursos naturais que serão transformados em riquezas. Quando todos têm acesso ao consumo de riquezas – comida, medicamentos, eletrodomésticos, livros, moradia, automóveis etc. – acabam-se os chamados problemas sociais, os quais, na realidade, são problemas econômicos e, por isso, não podem ser erradicados com filantropia. Naturalmente, o padrão de vida das sociedades fica limitado pela disponibilidade desses recursos, pela capacidade de transformá-los em riquezas e pelos custos dos impactos ambientais. Até a quantidade de fotossíntese, necessária à produção de comida, é limitada pela densidade de potência de 1370 watts por metro quadrado que o sol fornece ao planeta. Não adianta querer mais energia, o sol não atende.
Sobre o assunto, é interessante reproduzirmos o que afirma a prestigiosa Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos (www.newdream.org): "Existem boas razões para nos preocuparmos com os impactos ambientais provocados por 5 bilhões de pessoas consumindo ao nível dos países desenvolvidos da Europa e América do Norte. Devido as altas taxas de crescimento econômico em muitas partes do mundo, bem como a rápida propagação de meios eletrônicos, publicidade e bens de consumo, nós devemos questionar que espécie de consumo futuro podemos esperar em áreas que agora estão restritas à pobreza e ao isolamento. Se todos desejarem ter o estilo de vida de alto-consumo do Ocidente, o implacável crescimento no consumo, no uso de energia, na produção de resíduos e emissão de gases pode ser catastrófico."
Por que seria catastrófico? Vejamos: os Estados Unidos, com 300 milhões de habitantes, 5% da população mundial, consomem cerca de um terço dos recursos naturais do planeta Terra, que tem 6,3 bilhões de pessoas. Por isso os americanos são ricos, porque produzem ou importam riquezas, as quais, naturalmente, têm origem na mamãe Terra; nada vem da Lua ou de Marte. Partindo desses dados concluímos matematicamente [*] algo surrealista: caso quiséssemos que todo habitante do planeta Terra passasse a ter o mesmo padrão de vida do homem americano, deveríamos multiplicar o atual consumo de recursos naturais por sete. Isto é, em média, sete vezes mais petróleo, sete vezes mais minérios, sete vezes mais energia, sete vezes mais comida, sete vezes mais água limpa e, naturalmente, sete vezes mais lixo, efeito estufa, poluição e outros impactos ambientais!
A pergunta é: a natureza agüenta? Os ecologistas e estudiosos têm respondido com um sonoro não! Precisaríamos de pelo menos dois planetas Terra.
Somando a tudo isso o egoísmo inerente aos humanos, concluímos a receita elementar que rege as relações internacionais: "farinha pouca, meu pirão primeiro!" Ou seja, devido às limitações físicas do planeta nem todos podem ser ricos. Por isso, é necessário manter o status quo entre as nações, abortar as tentativas de crescimento dos países pobres através de receituários recessivos, diminuir o padrão de consumo dos remediados e, quando muito, manter os miseráveis na linha mínima de sobrevivência. Além disso, deve-se continuar as exportações para os países desenvolvidos de riquezas e recursos naturais, incluindo a energia. "Exportar é o que importa!" Lembram-se?
Agora fica fácil compreender porque muitos brasileiros trabalham duro e não têm acesso nem ao consumo básico. A recessão, argentina ou brasileira, por exemplo, significa o quê? Desemprego, é claro, porque o desempregado come menos, consome menos. Taxar aposentado também é condená-lo a consumir menos. Mas, menos em favor de quem, cara pálida?
Bem-estar só para poucos, esta é a lógica da globalização, da internacionalização das economias, das privatizações, do enfraquecimento do estado, da criação de agências nacionais que se curvam às concessionárias, das altas taxas de juros que mantêm a recessão e o desemprego, do controle de 70% do nosso PIB por estrangeiros e das chamadas reformas, inclusive a da previdência. Tudo se resume ao controle do consumo e à transferência assimétrica de recursos. Não é à toa que o FMI tem elogiado programas assistencialistas e governos que submetem o povo a essas políticas das trevas.
Peço licença a Marx para enfatizar que a luta básica das sociedades não é simplesmente a luta de classes, mas sim a luta pelo acesso às riquezas, que agora está limitada por fatores ecológicos. É melhor falar assim, porque essa assertiva nos leva à busca do conhecimento necessário à produção, ou seja, nos leva ao desenvolvimento, enquanto o termo luta de classes pode nos induzir apenas à expropriação. Mesmo assim, é difícil convencer um rico a reduzir o seu alto padrão de consumo. É por isso que os Estados Unidos recusaram-se a assinar o protocolo de Quioto que limitava a emissão de poluentes causadores do efeito estufa. Na mesma linha, podemos compreender que a ocupação do Iraque foi para ajudar a manter o elevado estilo de vida americano, dependente do petróleo, e defender o padrão dólar que dá aos Estados Unidos a primazia de trocar papel pintado (moeda) por mercadorias.
O maior desafio de um governo responsável é encontrar os caminhos do desenvolvimento sustentável, que faça a economia crescer sem exaurir de forma irreversível os nossos recursos naturais. Junto a isso, é necessário romper com as amarras internacionais que nos impõem o atraso e o subdesenvolvimento como estilo de vida. O brasileiro não merece ficar toda uma existência apertando o cinto. Nem precisamos esbanjar, mas seria mais humano se a maioria vivesse melhor. A felicidade aumentaria e até a criminalidade iria despencar.
[*] Demonstração matemática:Seja R o consumo de recursos naturais no mundo atual (grandezas não homogêneas). Os Estados Unidos consomem R/3.Consumo per capita do homem do mundo: R/6,3bilhões;Consumo per capita do homem americano: (R/3)/300milhões;Seja M o número que devemos multiplicar o atual consumo per capita do homem do mundo para que este se iguale ao do homem americano. M(R/6,3bilhões) = (R/3)/300milhões Simplificando R, obtemos M=7.

*Weber Figueiredo, ex-presidente da Superintendência Estadual de Rios e Lagoas-RJ (Serla), é professor de Engenharia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) e do Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet-RJ).

quinta-feira

Venezuela: Cerco total às terras improdutivas

Claudia Jardim*

A reforma agrária será uma das prioridades da nova etapa da revolução bolivariana. Um decreto federal para acelerar a lei de reforma agrária, a mudança do ministro de Agricultura e Terras e o apoio dos governos estaduais serão as ferramentas utilizadas na "guerra contra o latifúndio" anunciada pelo presidente Hugo Chávez.

No dia 10 [10/1/2005], no relançamento da missão "terra e homens livres", o presidente venezuelano assinou um decreto que pretende unificar a interpretação da Lei de Terras [*]. Com isso, o processo de identificação dos terrenos públicos e privados e dos latifúndios tende a ser acelerado. "Do resultado da fiscalização dependerá as ações posteriores. Se os papéis estão em ordem, não haverá problemas", afirmou Chávez, referindo-se às desapropriações de terras privadas.

A demissão de Arnoldo Marquez, ministro de Agricultura e Terras, deve facilitar a execução da lei. Marquez era visto pelos movimentos sociais do campo como um aliado do latifúndio e das transnacionais produtoras de sementes (a Venezuela importa 90% das sementes que utiliza na produção agrícola).

SINTONIA

Dia 9, o governo do Estado de Cojedes, apoiado pela guarda nacional venezuelana, desapropriou, para fins de reforma agrária, uma propriedade de 129,5 mil hectares. As terras pertenciam a Lorde Vestey, aristocrata inglês e magnata da carne bovina. De acordo com o jornal Financial Times, Vestey é um dos homens mais ricos da Grã-Bretanha e amigo íntimo do príncipe Charles.

Alfredo Toro Hardy, embaixador da Venezuela em Londres, declarou que a fazenda de Vestey estava entre as consideradas "parcialmente improdutivas", e que seus títulos de propriedade "não estavam em ordem apropriada". Foi isso, segundo Hardy, que provocou os procedimentos de investigação. Há quatro anos, a propriedade foi parcialmente ocupada por camponeses sem-terra.

Alem de Cojedes, mais três Estados anunciaram decretos de desapropriações. Em Monagas, a medida deve liberar, inicialmente, 50 mil hectares, dos quais 45 mil são de propriedade privada. Os 10 mil hectares restantes são considerados terras públicas.

DIÁLOGO

"Sob a luz do diálogo" entre governo e latifundiários, o governador do Estado de Táchira, Ronald Blanco La Cruz, assinou, dia 6, um decreto autorizando a elaboração de um mapa do latifúndio no Estado. "Vamos chamar os donos das terras para acertar esses acordos e ver por onde começar (as desapropriações)" afirmou Blanco La Cruz. Os governadores de Lara e Yaracuy devem anunciar medidas semelhantes nos próximos dias.

As ações dos Estados são uma resposta à determinação do presidente Hugo Chávez que, em reunião de 48 horas, a portas trancadas, no mês de novembro, determinou a execução da Lei de Terras. De acordo com fontes do governo, Chávez disse que fazer a reforma agrária era um dos compromissos que ele havia assumido com o país, e que não admitiria latifúndios de terras improdutivas.

EMPREGO

Além de "combater a injustiça social" como declara o presidente venezuelano, o estímulo à produção agrícola deve contribuir para a criação de novos empregos. Em um país onde 51% dos trabalhadores estão na economia informal e 3,6 milhões estão desempregados (15% da população) - a redistribuição de terras possibilitará a construção dos chamados núcleos de desenvolvimento endógeno, que têm na agricultura um dos principais pilares. De acordo com Miguel Angel Nuñez, assessor do governo para questões agrícolas, tais núcleos podem gerar milhares de postos de trabalho.

Outro tema presente nas discussões no Palácio Miraflores é a necessidade de alcançar a segurança alimentar. O quarto maior exportador mundial de petróleo importa 70% de seus alimentos, o que significa gastos de 2 milhões de dólares mensais. "Se não aplicarmos a lei (de terras), o Estado continuará perdendo divisas", afirma o deputado Eddy Gómez, do partido governista Movimento Quinta República (MVR).

Os planos são ambiciosos. Gómez acredita que a Venezuela tem potencial agrícola suficiente para produzir seus próprios alimentos e diversificar as exportações por meio de intercâmbios comerciais com a União Européia, Mercado Comum do Sul (Mercosul), Comunidade do Caribe (Caricom) e outros parceiros como Irã, China e Cuba.

REAÇÃO

A reação à iniciativa do governo foi imediata. No dia 30 de dezembro, o dirigente camponês Alejandro Márquez foi assassinado por pistoleiros quando saía de sua casa, no Estado de Barinas. Márquez era um dos coordenadores das cooperativas da região que foram beneficiadas com a entrega das Cartas Agrárias, instrumento que permite ao agricultor o uso da terra e o acesso ao crédito para a produção.

De acordo com informações oficiais, desde que foi promulgada a Lei de Terras, 91 camponeses foram assassinados. Entidades de direitos humanos estimam que o número real pode superar as 300 mortes. Os assassinatos continuam impunes.

Para o assessor presidencial Maximilien Arvelaiz, o próximo ano será crucial para o campesinato venezuelano. "Não poderá haver uma revolução na Venezuela se não conseguirmos realizar a revolução agrária. Mais do que nunca vamos necessitar do apoio e da vigilância internacional", avalia.

[*] Lei de Terras: Criada em 2001, a lei - um dos motivos que levaram a oposição ao fracassado golpe de 11 de abril - classifica como latifúndio a propriedade rural com mais de 5 mil hectares. O proprietário que não utiliza a terra para a produção pode ser punido com o pagamento de uma multa, que varia conforme o número de hectares improdutivos. Se, ainda assim, a propriedade continuar sem produção, é acionado o processo de desapropriação, no qual o Estado deve pagar pela aquisição da terra.

* Da redação do jornal Brasil de Fato, com informações da agência Venpres (www.venpres.gov.ve).

Fonte:
http://www.brasildefato.com.br/americalatina/98cercototal%20asterras.htm

terça-feira

Cartum:

Cartum de autoria do Maringoni.



segunda-feira

Mobilização social: Uma América Latina em transformação


Escreve Mário Augusto Jakobskind, do Rio de Janeiro (RJ)Jornal Brasil de Fato, 30 dezembro a 5 de janeiro 2005.


Para muita gente, sobretudo para os que acompanham as transformações na América Latina, o nome da cientista política Marta Harnecker é conhecido. Há anos, as suas análises têm sido indispensáveis para entender o que se passa no continente. Chilena que viveu anos em Cuba, depois de fugir da repressão do general Augusto Pinochet, esta pensadora sintonizada com o movimento operário tem percorrido inúmeros países, inclusive o Brasil, para conhecer de perto a realidade do movimento social e popular. Atualmente, ela está debruçada sobre a revolução bolivariana liderada pelo presidente Hugo Chávez Frias. Marta Harnecker esteve recentemente no Rio de Janeiro, acompanhando a comitiva do governo da Venezuela que veio participar da Cúpula do Rio de Janeiro.


Brasil de Fato - Como a senhora está vendo a conjuntura da América Latina depois da reeleição de George W. Bush?
Marta Harnecker - Todos sabíamos que não havia grande diferença entre John Kerry e George W. Bush em matéria de política internacional. Com Kerry, a política externa não mudaria muito, mas haveria alguma diferença. Por isso, eu estava do lado daqueles que, nos Estados Unidos, apoiavam o candidato democrata. Para as nossa lutas, a situação não muda muito. Temos que enfrentar o império com toda a sua força.BF - Nada, então, muda para nós?Marta - Eu acho, repito, que as nossas tarefas não mudam muito, porque em nosso continente a resistência contra o modelo neoliberal avança, seja com Kerry ou Bush. Ainda falta muito por construir, mas estamos avançando. Os resultados das eleições dos últimos anos refletem isso. Os nossos povos estão escolhendo candidatos que, ao menos simbolicamente, representam uma alternativa ao neoliberalismo. Digo simbolicamente, pois, entre a execução do programa e a prática, em alguns casos há ainda grandes distâncias. Distâncias que, se não são encurtadas, recebem a punição dos povos, como no caso do presidente Lucio Gutiérrez, do Equador.
BF - E quando as promessas não são cumpridas?
Marta - No caso equatoriano, é evidente que os movimentos indígenas que apoiaram Gutierrez já concluiram que erraram e têm de buscar alternativas. Não seria surpresa se o presidente fosse derrubado. Nossos povos chegaram ao estágio em que, pelo menos, estão dispostos a resistir. Conseguiram mudar governos, como o de Fernando de la Rua, na Argentina, e, na Bolívia, a troca de Gonzalo de Lozada por Carlos Mesa. Mas não basta resistir, ou derrubar governos. Não estamos mais na época de uma esquerda destrutiva, mas na de uma esquerda que possa criar alternativas. Para isso, é fundamental a organização popular. Hoje, sem ela, nenhuma alternativa é possível. É o que mostra a Venezuela, onde o presidente Chávez ganhou oito processos eleitorais, foi confirmado democraticamente. Ele conseguiu vencer e crescer porque o povo foi se organizando.
BF - Por favor, explique melhor.
Marta - O venezuelano é um governo que está se movendo no quadro institucional herdado, mas faz um grande esforço para mudá-lo. Foi o governo da América Latina que colocou como fundamental que, para transitar pela via pacífica, era necessário mudar as regras do jogo institucional anterior. Conseguiu mudar a Constituição, mas não basta isso. É necessário criar leis, ter uma correlação de forças no Parlamento que permita fazê-las. O aparato institucional e burocrático, tanto nos ministérios, como nos governos estaduais e prefeituras, foi herdado. Um tal aparato impede a materialização de um projeto de país diferente e transformador.
BF - Como o governo Chávez mudou o quadro?
Marta - O aparato institucional pode triturar os quadros. Para avançar nas medidas sociais, resolver os problemas mais agudos do povo como a pobreza, o analfabetismo, educação, saúde, o governo bolivariano criou missões, ou seja, espaços de atuação fora dos ministérios. Esta foi a maneira de atender gente que nunca foi atendida, pois os ministérios eram estruturalmente incapazes de fazê-lo.
BF - Isso acontece no Brasil e em toda a América Latina.
Marta - Claro. Com um esquema viciado era impossível cumprir todas as tarefas sociais. O presidente Chávez partiu para novas formas de organização dos ministérios, ou até criou novos. Nesses, o povo organizado teria de ter ativa participação, tanto na fixação das metas locais como no controle das tarefas. Nada disso é possível sem que se organize e pressione. O povo tem que ajudar, e o governante aceitar a pressão popular.
BF - E quando isso não acontece?
Marta - Há um tema muito complicado para a esquerda, a do que fazer quando não há candidatos que a representam. Foi o que aconteceu nas últimas eleições na Venezuela, onde havia candidatos sem muito apoio, mas foram impostos pela cúpula. Os eleitores reclamaram por esses candidatos terem sido eleitos. Temos que analisar a questão da abstenção na Venezuela, que foi grande.
BF - Grande quanto?
Marta - Cerca de 60%. No processo venezuelano, eu sustento que toda a pedagogia do presidente Chávez leva ao crescimento político do povo. Esse povo que saiu às ruas e conseguiu a volta de Chávez, sem que tenha havido uma orientação política, sentindo-se protagonista. Apesar de toda a campanha midiática contra o governo. Um povo que, além disso, decidiu bloquear a informação, simplesmente deixando de ver as televisões opositoras e comprar os jornais desses grupos.
BF - Então, o papel da mídia é relevante?
Marta - Sabemos que a guerra atual é midiática. Lembro sempre o que Noam Chomsky diz: a repressão está para a ditadura, como a propaganda para a democracia. Ou seja, a democracia burguesa pode se manter porque a mídia convence as pessoas que esse é o melhor dos mundos, cria ilusões com as novelas, que hoje são o ópio do povo. No Brasil me assombra que pode haver muitas favelas, mas em todas as casas se vê uma antena de TV.
BF - E como fazer frente ao poder midiático?
Marta - Não há como as forças progressistas competirem com a mídia burguesa. Então, qual a saída? A nossa prática diferente. Por que em Porto Alegre, durante muito tempo, com toda a mídia contra, a esquerda no governo cresceu? Porque houve uma prática política diferente e as pessoas viam, e quando isso acontece, cria-se um distanciamento crítico diante das mensagens da oposição.
BF - No Uruguai, além da vitória de Tabaré Vasquez, foi importante a esquerda ter conseguido também maioria parlamentar?
Marta - Claro. E isso vale para Lula, pois não se pode julgar os governos sem uma análise sobre a correlação de forças. Quando a esquerda analisa um governo muitas vezes esquece da correlação de forças. Não se pode comparar o governo de Chávez com o de Lula. O primeiro, como diz o próprio Chávez, é uma via pacífica, mas não desarmada. O que significa isso? Que o povo está armado? Não. Significa que é uma via pacífica que conta com o apoio da força armada institucional, quer dizer, a grande maioria do Exército apóia Chávez.
BF - E no Brasil?
Marta - Chávez é o primeiro governo que se coloca como bandeira de sua eleição a mudança da regra do jogo institucional, porque sabia que precisava de uma nova Constituição, e fez a propaganda eleitoral pregando uma Assembléia Constituinte. E conseguiu mudar a Constituição e, logo, a correlação de forças do aparato institucional. Isso o Lula não conseguiu. Mesmo que Lula ganhasse com maior apoio eleitoral do que o de Chávez, em 1998, não se pode esquecer que estes resultados foram produto de uma ampla política de alianças, necessária para ganhar nas urnas, e mais necessária para governar o país. O Partido dos Trabalhadores é minoria em ambas as câmaras do Poder Legislativo. A isso, acrescente-se que o Brasil depende muito mais do capital financeiro internacional que a Venezuela com o seu petróleo.
BF - Como vê as diferenças entre o governo da Venezuela e o de outros da América Latina como o Brasil e Argentina, por exemplo?
Marta - Além da correlação de forças, da mudança da Constituição, de uma nova correlação de forças nas instituições, e de apostar na organização popular, está a questão do petróleo. Ou seja, a Venezuela, é um país imensamente rico que tem uma grande entrada de divisas com o óleo negro que, num primeiro tempo, estava bloqueado pela exigência da oposição. Hoje, com as divisas com o petróleo, a Venezuela tem a possibilidade de não depender das políticas do Fundo Monetário Internacional. Não é a situação da maior parte dos países latinoamericanos. Outros países não têm a liberdade econômica que tem a Venezuela.
BF - A senhora critica as críticas da esquerda a Lula?
Marta - Acho que é necessário ter em conta muitos elementos e, que, às vezes, a crítica é um pouco superficial. É preciso criar alternativas. Aplaudo aqueles que dizem não estar de acordo com o que está ocorrendo no Brasil, mas reconhecem que há um governo em disputa e se não existem forças capazes de inclinar balança, isso fica assim mesmo. Há uma responsabilidade muito grande do pessoal que critica. Ser radical não significa pronunciar-se a favor de soluções mais radicais, mas criar as condições para fazer as coisas. Lembro que os salvadorenhos discutiam fazer uma passeata pela paz e discutiam se sairiam com a bandeira do socialismo ou da paz. Os mais radicais queriam a primeira. Os outros diziam que com a da paz reuniriam cristãos e pessoas que não eram socialistas. Decidiram finalmente fazer uma marcha pela paz e reuniram uma enorme quantidade de gente. Todos os que assistiram saíram fortalecidos para continuar a luta. Isso muito mais radical.
BF - Então, qual é o caminho?
Marta - Eu acredito muito em construir forças. Eu diria que esse é o meu tema. A arte da política é essa: criar forças para fazer no futuro o que não se pode fazer hoje. Há uma reflexão sobre quem é o oportunista. aquele que diz que não tem força e se adapta. O revolucionário é aquele que sabe que não tem força, mas se coloca de forma a criar condições para isso. Inventa, busca, como mudar a correlação de forças. São duas posições distintas: uma conformista, oportunista, outra, para mim, revolucionária, a que trabalha por construir as forças que permitam alcançar os objetivos. Equivocam-se os que acreditam ser mais de esquerda porque lançam discursos muito de esquerda. E digo mais: aquele que queira ser radical, que trabalhe para construir as forças sociais e políticas que permitam sê-lo. Luta-se criando. Por isso, gosto da idéia de distinguir entre uma esquerda destrutiva e uma construtiva. (Participou Beatriz Bissio)

quarta-feira

Cartum:

O Cartum abaixo é de autoria do gaúcho Edgar Vasques, onde se faz a crítica a privatização da água.




terça-feira

Rebeldes tomam quartel e pedem renúncia do presidente no Peru
Lima - O major da reserva peruano Antauro Humala e 350 reservistas armados que pediam a renuncia do presidente Alejandro Toledo se comprometeram domingo (2) a entregar as armas sob a presença de um mediador da Igreja Católica, após um ataque que deixou cinco mortos e muitos feridos na cidade andina de Andahuaylas. O grupo de militares surpreendeu o governo de Toledo na madrugada do primeiro dia do ano de 2005.
Humala, que também pediu a demissão dos chefes militares, lamentou a morte de cinco policiais, que tentaram avançar sobre quartel da polícia que o militar insurgente mantém sob controle. O grupo nacionalista de Humala tornou-se conhecido em 2000, quando, então liderado por Ollanta Humala, irmão de Antauro, se mobilizou contra o presidente Alberto Fujimori, durante o escândalo de corrupção gerado por seu chefe de segurança Vladimiro Montesinos.
Toledo, após visitar militares feridos no Hospital Policial, disse que seu governo será rígido para punir os responsáveis pela morte dos agentes de segurança em Andahuaylas, que fica no departamento (estado) andino de Apurímac. O presidente peruano teve de suspender seu descanso de fim de ano em uma praia no extremo norte do país e convocou uma reunião de urgência do Conselho de Ministros. Fontes governamentais informaram que nessa reunião de ministros, no Palácio de Governo de Lima, discutiram-se as medidas legais para dominar e punir os insurgentes. Enquanto isso, foi informado que pelo menos 250 militares da Divisão de Forças Especiais do Exército foram mobilizados seguiram para Andahuaylas, somando-se aos destacamentos de policiais antimotins. "A ordem e a autoridade serão restabelecidas", declarou um funcionário do Palácio de Governo, que pediu para não ser identificado e garantiu que as ordens foram dadas pelo presidente do Conselho de Ministros, Carlos Ferrero.
Ferrero não informou como serão as ações para dominar os rebeldes, que afirmam ter sob controle dezenas de policiais do quartel. Ele declarou que Humala e seu movimento estão ligados ao narcotráfico e que sempre foram violentos. O líder insurgente, em entrevista a jornalistas, desmentiu a versão. A ação ocorreu num momento delicado para Toledo, em que seu governo está envolvido nas negociações do Tratado de Livre-Comércio (TLC) Andino, ao lado de EUA, Equador e Colômbia. Grande parte dos movimentos sociais e indígenas do país, além de setores nacionalistas do país, são contra o acordo.
*. Com informações da agência Ansa e do jornal La Jornada

segunda-feira

Cartum da semana:

Cartum de autoria do Maringoni




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