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terça-feira


Considerações sobre a disputa política da Reforma Universitária



Toda a ação tem uma reação, esta máxima da Física se presta perfeitamente a sua aplicação em outros terrenos. Esta reação pode nos servir muito bem como forma de aprofundar e elucidar a análise sobre a ação que a originou.
O anteprojeto de Reforma Universitária apresentado pelo Ministério da Educação (MEC) em Dezembro de 2004, provocou inúmeras, e contraditórias entre si, reações a proposta. Estas reações vão desde uma análise de que "a reforma do governo tem como objetivo adequar o ensino superior no Brasil à ALCA, aos planos do FMI e do Banco Mundial." 1 ao extremo oposto, de que ela seria uma "reforma universitária de orientação soviética" 2.
Estes elementos nos balizam a compreender a disputa política que se dará sobre o tema e quais as estratégias adotadas pelos diferentes setores. Da mesma forma que, mesmo que de maneira involuntária e adotando discursos e táticas opostas, estas ações podem acabar por se assemelhar e até mesmo se confundir. Podendo, pelo desenvolvimento e pelos fatos até o momento colocado acabarem por ter o mesmo vórtice de ação final.
A crítica à "esquerda"
A reação dos setores que a classificam como sendo uma "contra-reforma privatista" não chega a ser uma novidade no cenário. Visto que antes da apresentação do mesmo, esta linha já estava definida e fechada. Ela se soma a uma estratégia mais geral adotada contra o conjunto de ações do governo3, e se mantêm indiferentemente da conjuntura colocada. Não levam em conta os avanços (ainda que insuficientes) contidos na proposta e nem se dispõem a estar apresentando alternativas.
Se antes da apresentação do anteprojeto do MEC esta política vinha ganhando alguma força, principalmente devido a ações equivocadas do governo, com um viés claramente privatista como a Lei de Inovação Tecnológica e o PROUNI, hoje, a tendência ao isolamento político é um fato dado. O anteprojeto do MEC foi em uma direção oposta ao que se especulava até então, e quem esperava uma política de viés privatista para poder assim crescer em uma política de oposição aberta, agora encontra grandes dificuldades para atuar.
A resistência dos "tubarões"
Por outro lado, a reação dos empresários do ensino chegou mesmo a causar surpresas a alguns. A primeira reação deste setor foi de ir para o enfrentamento direto, chegando mesmo a declarar que a Reforma Universitária deveria ter como destino "a lata de lixo" 4. E já demostram que pretendem entrar duramente nesta disputa, ao articularem o chamado "Fórum Nacional da Livre Iniciativa na Educação", fórum que congrega entidades representativas do setor, instituições privadas e algumas filantrópicas.
Este setor, que possui forte apoio da mídia grande e que movimenta cifras volumosas de recursos, deve usar de toda a sua força para barrar qualquer possibilidade de mudança no quadro atual, e ainda se possível ampliar as suas benesses. O que ocorreu com o PROUNI é um claro exemplo disso. Um programa que para obter bolsas de estudo, amplia a isenção fiscal das privadas e possibilita um melhor incremento na receita destas. Sofreu um ataque dos "tubarões do ensino" 5 e acabou por ficar ainda mais generosos, ao reduzir a contrapartida que as instituições privadas teriam de dar para aderir ao programa. Isto para não rememorarmos o ocorrido na aprovação da Lei de Diretrizes e Base da Educação de 1996.
A linha geral que se observa do setor privado, que está assumindo um enfrentamento mais direto, é de adotar uma busca de ampliação de seu "status quo", ou se preferir de seu "programa máximo". Prova disso é as declarações dadas pelo Prof. Paulo Antônio G. Gardim, vice-presidente da CONFENEN6, de que a principal mudança que o país precisa no ensino superior "é a desburocratização dos critérios e procedimentos para a autorização e a avaliação da educação superior mantida pela livre iniciativa"7, o que é uma grande falácia, pois mais "desburocratizado" somente com a desregulamentação completa e a ausência plena do Estado, bem ao gosto dos neoliberais. O que fica mais explicitado ainda quando diz que as "metas para a expansão do ensino público são totalmente fora da realidade orçamentária federal"8, deixando claro a contrariedade a uma retomada de um papel central ao setor público no sistema de ensino superior brasileiro.
O grande temor deles é de que haja algum nível de controle do Estado sobre o papel social que a educação deve ter. Por isso a crítica a criação dos Conselhos Comunitários Sociais, como coloca o Prof. Dr. Clóvis Pinto de Castro, vice-reitor Acadêmico da Universidade Metodista de São Bernardo do Campo (SP) "nós já tínhamos autonomia garantida pela Constituição. Essa ingerência estatal não é bem vinda". O objetivo de aprovar uma Lei Orgânica a Educação Superior, significa regulamentar o Artigo 207 da Constituição Federal (as tais garantias constitucionais referidas pelo vice-reitor). Este mesmo ponto da Reforma também sofreu críticas do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN9), estes alegam não caber regulamentação por ser auto-aplicável. 10 Estranha similaridade de posições de atores tão opostos!
Avançar é preciso
Neste cenário, cabe a quem luta em defesa da educação em quanto um direito e não um serviço, e que deva ser pública, gratuita, de qualidade e universal, a desconstituição destas posições, antagônicas e ao mesmo tempo similares. E para que estas posições, principalmente a dos empresários do ensino, não derrotem a possibilidade das mudanças que é necessário que haja uma alteração de método de ação do MEC. Que ao invés de priorizar somente reuniões com representações institucionais, ainda que tenha a sua importancia, propicie mecanismos de participação ampla e direta. Só com participação popular as ações dos "tubarões do ensino" poderão ser barradas. Por isso, os movimentos populares como um todo, devem somar esforços para construir uma Conferência Nacional da Educação Superior, para garantir as alterações necessárias ao anteprojeto e para dar a força popular necessária para barrar o "lobby" do poder econômico.
Mas também é tarefa lutar por modificações importantes no anteprojeto, que dêem conta do acúmulo histórico do movimento social de educação. Lutar para que o Estado assim, cumpra o seu papel regulador e sedimente as condições necessárias para a alteração do perverso quadro do ensino superior no Brasil, derrotando definitivamente o fantasma do neoliberalismo.
Erick da Silva
Diretor de Universidades Privadas da UEE/RS

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1 Em www.pstu.org.br
2 Revista VEJA n°04, edição 1889.
3 A estratégia de grupos como PSTU, setores do PSOL e cia, é de estar derrotando o governo a esquerda, denunciando o seu suposto viés neoliberal global, indiferentemente do mérito e do conteúdo do que está sendo proposto, devido a uma questão taticista e de um projeto claro de auto-construção.
4 Revista VEJA n°04, edição 1889.
5 Expressão cunhada pelo movimento educacional para denunciar a ação predatória dos donos das instituições privadas de ensino.
6 Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino
7 Revista Ensino Superior, Ed. 77
8 Idem.
9 Sindicato que recentemente desfiliou-se da CUT
10 Revista Ensino Superior, Ed. 77

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