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sexta-feira


Os sem Playstation

Emir Sader*

A menos de um mês do Dia das Crianças, vale a pena chamar a atenção sobre as crianças que não possuem Playstation, nem o 1, nem o 2. Elas compõem o universo dos 600 milhões de meninos e meninas que vivem na pobreza no mundo.
Aproxima-se mais um Dia das Crianças. Antes que a mídia projete as cenas de compra nos shopping centers, vale a pena chamar um pouco a atenção sobre as crianças que não possuem Playstation, nem o 1, nem o 2. Estas são, aliás a grande maioria das crianças.
Mais de 10 milhões de meninos e meninas do mundo morrem de doenças passíveis de serem prevenidas, 600 milhões delas vivem na pobreza e mais de 100 milhões – na sua maioria meninas – não vão a escolas. A maioria dos quase 200 milhões de crianças e jovens menores de 18 anos da América Latina, do Caribe, dos Estados Unidos e do Canadá vivem na pobreza. Em um país como o Uruguai, até a pouco citado como uma das “Suíças da América Latina”, 46,6% das crianças de menos de 6 anos viviam em uma família pobre em 2002. Na Argentina, igualmente citada até a pouco tempo por seus índices sociais “europeus”, a incidência da pobreza entre crianças de 6 a 12 anos é de mais de 60%, comparada com uma média geral de 41,5%.
A América Latina, região privilegiadamente vítima das políticas de ajuste fiscal do neoliberalismo, foi a região que mais foi afetada pela desigualdade nestes anos. A taxa de mortalidade infantil de menores de 5 anos é de 7 por mil nos EUA e de 8 por mil no Canadá, enquanto que no Haiti é de 123, na Bolívia é de 77 e na Guiana é de 72 por mil. A única grande exceção é Cuba, com uma taxa de 9 por mil, típica de países do centro do capitalismo.
Pelo menos 2 milhões de meninos, e principalmente de meninas, estão vinculados ao trabalho infantil na América Latina e no Caribe, sendo vítimas de todo tipo de exploração, discriminação e violências verbais e físicas, assim como abusos sexuais. A cada ano, 1,2 milhão de crianças são vítimas, segundo a Organização Mundial do Trabalho (OIT), de um negócio que produz 100 milhões de dólares no mundo.
Meninos e meninas trabalham na agricultura, em tarefas domésticas, em fábricas, nas ruas, são expostos à desnutrição, ao contágio da Aids, ao narcotráfico e à violência. Não dispõem de proteção social e jurídica, são submetidos a jornadas de trabalho de 12 a 16 horas diárias, sob duras condições. São negados a eles os direitos a estudar, a brincar, a ter boa saúde, a conviver com suas famílias, a se reunir com seus amigos, a uma casa digna. Segundo a OIT, os dados de trabalhadores domésticos infantis é espantoso: no Peru, 110 mil; no Paraguai, 40 mil; na Colômbia, 64 mil; na República Dominicana, 170 mil; apenas na Guatemala, 40 mil; no Haiti, 200 mil; e no Brasil – o campeão de trabalho doméstico na América Latina e talvez no mundo – 500 mil.
A maioria dos países do mundo ratificou a Convenção sobre os Direitos da Criança, reconhecendo meninos e meninas como sujeitos de direitos, assumindo compromisso de proteger seus direitos, embora isto não constitua uma garantia para que tenham sejam respeitados. Mesmo assim, dois países do mundo não assinaram essa Convenção: a Somália e os Estados Unidos (sic). Julgue-se como se queira os limites que unem países que costumam ser apontados pela mídia como exemplos de “civilização” e de “barbárie”. Nada como a forma como as crianças são tratadas, para saber como cada país cuida do seu futuro.

*Emir Sader, professor da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), é coordenador do Laboratório de Políticas Públicas da Uerj e autor, entre outros, de “A vingança da História".

Fonte: www.agenciacartamaior.com.br

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